Kallos graphein bacterium
Academic project for the MA in Typographic and Editorial Contemporary Practices exploring alternative ways to represent the written word, by uniting form, concept and execution. In this case, I explored bacterial calligraphy and the subjectivity of the letter as symbol.
In Portuguese – English abstract below.
A palavra “Caligrafia” é formada por dois vocábulos gregos: KALLOS, que significa “belo”, e GRAPHEIN, que significa “escrita”. (1)
“Bactéria”, do latim BACTERIUM, do grego antigo “bakterion”: pequeno bastão. (2)
Resumo
Abstract
Palavras-chave
Caligrafia, Bactérias, Tipografia, Tipografia experimental, Caligrafia bacterial
Introdução
A work of design can be called “deconstruction” when it exposes and transforms the established rules of writing, interrupting the sacred “inside” of content with the profane “outside” of form. (3)
A tipografia – a representação visual da linguagem – tem uma vertente inevitavelmente prática, com um propósito muito concreto de comunicação e vinculação de uma mensagem. No entanto, a exploração formal e conceptual pode levar a resultados que questionam os limites da disciplina. Stefan Sagmeister é um excelente exemplo do uso de materiais e técnicas alternativas para criar composições tipográficas exploratórias (4). Entre os materiais que usou, destacam-se uma parede de bananas, tubos, até mesmo cortar o próprio corpo. Estes métodos pouco ortodoxos mostram-nos que é possível unir design emocional, divertido, exploratório, com excelentes conceitos. Comunica-se, mesmo antes de ser ler o texto.
Este projecto teve como objectivo trabalhar a subjectividade da letra como símbolo, re-interpretando o modo como a construímos e a ligação possível que o meio, o processo e consequente forma, podem ter com o conceito representado. A palavra como elemento comunicacional não existe apenas na sua vertente de significado verbal – existe todo um universo visual que pode ser explorado de forma a exacerbar esse significado e o modo como percepcionamos o conteúdo. Tal como afirma David Carson, “never mistake legibility for communication”(5). A palavra escrita pode ser legível, compreensível, mas a sua componente gráfica, conceptual e emocional são factores cruciais na criação e utilização da tipografia no design.
Com o objectivo de explorar formas visualmente interessantes de desenhar a letra, unindo o conceito, à forma, e à própria matéria física, focou-se na Bio Art, mais concretamente na Microbial Art – peças criadas usando organismos vivos, como bactérias ou fungos.
Artistas como Marta de Menezes e Eduardo Kac têm vindo a apagar a fronteira entre “arte” e “ciência” unindo estas duas áreas de estudo. Os seus projectos no campo da Bio Art mostram como técnicas científicas podem ser usadas para desenvolver fortes projectos artisticos. Marta de Menezes, por exemplo, desenvolveu o projecto Proteic Portrait (2002-2007) onde explorou a intersecção entre arte e biologia através da adaptação de técnicas modernas de biologia molecular na produção das peças. Aqui, tirou partido das vantagens estéticas e conceptuais das proteínas com o objectivo de criar auto-retratos usando essas proteínas como meio (6).
No seu projecto Cypher (2009), Eduardo Kac uniu escultura, livro de artista e um kit transgénico DIY. O kit abre ao meio como um livro e no seu interior encontra-se um “mini-lab” com pratos de petri, agar, nutrientes, pipetas, tubos de ensaio, DNA sintético, (entre outros) e um pequeno livro com as instruções do processo. O conceito base deste projecto é passar para as mãos do espectador o poder de literalmente dar vida à peça (7).
Seguindo então esta área de estudo, proposemos criar uma representação tipográfica do “eu”. A contribuição no desenho da letra seria o canal para as funções normais dos organismos – crescer e dividir-se. Outro dos objectivos em trabalhar com esta técnica foi usar um sistema parcialmente autónomo, e logo cujo resultado não estivesse totalmente sob o nosso controlo.
Foi usada a manualidade da caligrafia, do gesto, para desenhar a forma. As colónias de bactérias foram criadas a partir de amostras recolhidas da flora bucal da autora. Com o apoio do Champalimaud Centre for the Unknown, foram utilizadas placas de petri com TSA (tripsona soya agar) onde foram desenhadas as letras. Ao longo de 7 dias registou-se o desenvolvimento das culturas de bactérias e fungos com o objectivo de escolher o ponto onde a letra seria mais reconhecível.
Sendo este um projecto experimental, o processo levou à concretização de vários caminhos representativos. Das várias letras e palavras, foram escolhidas as que resultaram em formas mais legíveis. Estas foram então concretizadas e interpretadas em diversos meios – fotografia final da cultura de bactérias, que foi depois usada como modelo para uma representação vectorial; um video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas; e uma animação simples criada a partir da forma vectorizada.
Experimentação e Implementação
Tendo sido escolhido o método microbial como técnica para criar a tipografia, passou-se à fase de testes. No projecto “Bacterial Calligraphy: A Memento for Undergraduate Research Students” (8), estudantes escreveram as suas iniciais com bactérias Chromobacterium violaceum, que resultaram em letras relativamente uniformes. No âmbito deste projecto, pretendia-se criar formas fragmentadas que se desenvolvessem independentemente, de modo a obter um desenho final mais complexo, e cujo desenvolvimento ao longo do tempo fosse interessante de observar. Um dos objectivos basilares é a exploração da forma tipográfica, logo o meio usado na criação da letra é de extrema importância.
Numa fase inicial, fizeram-se testes com colónias de bactérias extraídas de água da torneira de uma garrafa já usada, de pele, de terra, e de células DH5α™. Tirando partido dos recursos disponibilizados pelo Laboratório de Neurobiologia da Acção do Champalimaud Center for the Unkown, utilizaram-se as amostras recolhidas para desenhar letras em placas de petri com gel TSA (triptona soya agar) (9), um meio de propósito geral utilizado para cultivo de uma grande variedade de microorganismos. Dos resultados conseguidos, as formas desenvolvidas a partir da água foram mais ao encontro do pretendido.
Primeiro teste com diferentes bactérias
Como o objectivo seria criar caligrafia, uma forma muito pessoal de representar a palavra escrita, decidiu-se unir a forma ao conteúdo através da utilização de bactérias recolhidas da flora bucal da autora, misturadas com água. De forma a não marcar o gel, no desenho das letras foram usados pincéis de caligrafia desinfectados.
Inoculação das bactérias no meio de culturas, realizado no Laboratório de Neurobiologia da Acção do Champalimaud Center for the Unkown.
As placas foram depois incubadas à temperatura ambiente e o desenvolvimento das bactérias registado em intervalos de cerca de 6 horas nos 2 primeiros dias, e de 12 horas durante os 5 dias seguintes.
Os desenvolvimentos das culturas bacterianas foram imensamente interessantes de observar ao longo dos dias. Apesar dos testes iniciais, os resultados foram, em parte, inesperados. As culturas desenvolveram colónias de diversos tamanhos e cores (ao contrário dos testes iniciais mais uniformes), tornando as formas das letras menos simples de discernir, mas mais ricas visualmente.
“a”, “b”, “type” e “ah!” após 1 semana de incubação.
Letra “b” – pormenor.
Letra “A” – pormenor.
Video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas ao longo de 6 dias – palavra “type”. Esta palavra tem melhor leitura passados 6 dias, em vez dos 8 dias das letras “a” e “b”, possivelmente pela espessura do traço.
Na fase final do projecto, foram escolhidas algumas das letras e palavras para desenvolver formalmente. Trataram-se as fotografias finais de cada letra (versão fotográfica), vectorizaram-se as formas recolhidas fotograficamente (versão vectorizada) e, nalguns casos, foi ainda criada uma experiência em animação (versão video). Com estes diferentes resultados pretendeu-se demostrar algumas das potencialidades formais da caligrafia bacteriana, e indiciar algumas das formas como poderiam ser posteriormente desenvolvidas e aplicadas em projectos gráficos – tipografia animada/video; desenvolvimento de uma fonte tipográfica; ilustração de um artigo; etc.
Letra “a”
versão fotográfica
Video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas ao longo de 8 dias – letra “a”.
versões vectorizadas
versão vectorizada video
versão fotográfica
Video time-lapse do crescimento das culturas bacterianas ao longo de 8 dias – letra “b”.
versões vectorizadas
versões fotográficas
versões vectorizadas
Conclusão
Os resultados finais provaram ser fascinantes e com potencialidade para exploração. A individualidade da caligrafia aliado à proveniência e textura das bactérias adicionam uma camada de significado e expressividade que podem ser explorados em projectos específicos. Aqui, o conteúdo pode habitar a forma, criando-a.
De futuro pretende-se utilizar esta técnica para desenvolver um tipo de letra experimental usando a expressividade das diferentes etapas de desenvolvimento da forma. Existe também a possibilidade de usar esta técnica para criar um tipo de letra animado.
Agradecimentos
Referências
(1) Cordeiro, Manuel de Oliveira. Compêndio de Caligrafia. Lisboa: Livraria Popular de Francisco Franco, 1963. N. pag. Print.
(2) “Bacterium.” Wiktionary. N.p., n.d. Web. 28 Dec. 2015.
(3) Heller, Steven, and Philip B. Meggs. “A Post-Mortem on Deconstruction?” Lupton, Ellen. Texts on Type: Critical Writings on Typography. New York: Allworth, 2001. N. pag. Print.
(4) Popova, Maria. “Things I Have Learned in My Life So Far: Sagmeister’s Typographic Maxims on Life, Updated.” Brain Pickings. N.p., 06 Feb. 2014. Web. 28 Dec. 2015.
(5) Carson, David. “Design and Discovery.” TED Talk. Feb. 2003. Lecture.
(6) Menezes, M., De. (n.d.). Proteic Portrait. Retrieved January 15, 2016, from http://martademenezes.com/portfolio/proteic-portrait-2/
(7) Kac, E. (n.d.). BIO ART. Retrieved January 15, 2016, from http://www.ekac.org/transgenicindex.html
(8) Ng, Wenfa. “Bacterial Calligraphy: A Memento for Undergraduate Research Students.” US National Library of Medicine National Institutes of Health. N.p., 3 Dec. 2012. Web. 28 Dec. 2015.
(9) Liu, Shijun, and Laurie Usinger. “All About Agar.” Sciencebuddies. N.p., n.d. Web. 28 Dec. 2015.
Torres, María Eugenia. “Relación Huésped Parasito: Flora Humana Normal.” (n.d.): n. pag. Instituto De Higiene Universidad De La Republica. Web. 28 Dec. 2015.
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